Imagem: Oficina de Imagens
NOTA PÚBLICA
O
Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social - Cendhec, entidade da
sociedade civil que tem a missão, dentre outras, defender e
promover os direitos humanos de crianças e adolescentes vem manifestar seu posicionamento
CONTRÁRIO ao conjunto de Propostas de Emendas Constitucional existentes no
Congresso Nacional, cuja finalidade é alterar o art. 228 da Constituição
Federal de 1988 para reduzir a Maioridade Penal e dar o mesmo tratamento a
adolescentes e adultos.
Inicialmente sugerimos a todos e todas,
a considerar que nós, de alguma forma, temos responsabilidades e deixamos marcas
na trajetória e história de vida desses adolescentes que, pela negação de
direitos, ausência dos pais/responsáveis, ação e omissão da sociedade e do
estado, encontra-se em prática de ato infracional ou vulneráveis a ela. Nesse
sentido, iniciamos nosso diálogo com uma lição do Gonzaguinha, nos ilumina que
nos chama a refletir:
“...E aprendi que se depende
sempre
De tanta, muita, diferente
gente;
Toda pessoa sempre é as marcas
Das lições diárias de outras
tantas pessoas.”
(Gonzaguinha.
Caminhos do Coração)
Nesse momento de reflexão, apresentamos
alguns aspectos relevantes que nos fundamenta a ser radicalmente CONTRA a
Redução da Maioridade Penal:
Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Latino Americano das Nações Unidas para
Prevenção e Tratamento do Delinqüente (ILANUD), 10% do total de crimes no
Brasil, são cometidos por jovens. Desse montante, cerca de 87% são atos contra
o patrimônio, como roubo e furto, e não contra a vida. E os atos infracionais
cometidos contra vida por adolescentes equivalem a menos de 2%. Em contraponto
a esta constatação, o que se vê é um elevado nível de responsabilização dos
adolescentes, posto que, em levantamento realizado em anos anteriores,
considerando um período de 10 anos, os 90% dos “crimes” cometidos por adultos
levou a duplicar o número de encarceramentos. Entretanto, identificamos que
neste mesmo levantamento, foi constatado que para aqueles adolescentes que
cometeram os 10% dos “crimes”, ou seja, a minoria, o número de adolescentes em
regime de internação simplesmente quadriplicou, (397% de elevação do índice). Na
mesma pesquisa é revelado que das violências cometidas contra a pessoa no país,
mais de 40% ocorrem contra os adolescentes e jovens.
Essa questão desfaz o mito de que nada
acontece com o adolescente que comete o ato infracional. Isso também é
reforçado pelo fato de que o adolescente infrator pode ficar até nove anos
respondendo por seus atos, através da progressão de medidas. Para especialistas
em justiça juvenil, a punição pode até ser mais rigorosa do que a dispensada a
um adulto. Por exemplo, um adulto pode responder por a uma acusação de
homicídio em liberdade, já o adolescente não, esse vai direto para o internamento.
Diante disso, ocorre que as
infrações praticadas por adolescentes ganham grande visibilidade e repercussão
na mídia, causando uma falsa impressão de que o número de atos cometidos
por adolescentes são elevados. Essa situação, além de desinformar a população
sobre a verdade dos fatos, termina que a induz a um erro de julgamento e
consequentemente deflagra uma campanha a favor da redução da maioridade penal,
sem nenhuma base legal, científica e social.
Em nome da
verdade e de uma postura justa, basta que se busque as informações nas Varas de
Infância e Juventude, Delegacias Especializadas e outras fontes, que qualquer reporte
ou cidadão comprovará que o alarde midiático e sensacionalista nestes casos não
condiz com a realidade em números e em fatos, prova disto é que a cobertura de
um episódio envolvendo um adolescente como autor da infração, repercute semanas
na mídia, já os cometidos por adultos, imensamente em maior quantidade, tem bem
menos repercussão e visibilidade, assim como os assassinatos de jovens no
Brasil, que não repercute tanto como deveria (ver mapa da violência).
O discurso
fácil daqueles que, ao invés de combaterem de forma efetiva e eficaz as
VERDADEIRAS causas da violência, pregam o ataque a seus efeitos, contribuindo
apenas para a perpetuação e agravamento do problema da violência.
Em termos de reincidência, o regime
prisional para adultos apresenta índice elevado, beirando os 90% de
reincidência, já o Regime de Internação para adolescentes chega a quase 60%.
Considerando que as unidades de internação ainda não estão cumprindo
devidamente o que rege o SINASE, negando dessa forma a vivência do processo
socioeducativo.
Portanto, está
mais do que provado que a punição pura e simples, bem como a quantidade de pena
prevista ou imposta, mesmo para o adulto, não é um fator de diminuição da violência.
Dessa forma, acreditar que com a redução teremos comprovada
a equação: “mais tempo de punição=menos crimes” é acreditar num MITO, concretamente a equação que pode
funcionar é: Direitos efetivados =
diminuição da violência.
Diante deste contexto, onde está o
respeito à condição de pessoa em desenvolvimento e ao princípio da brevidade? O
afastamento que, em tese, deveria ser temporário, passa a ser duradouro. Depois
de anos de lutas, nacionais e internacionais, pela garantia de direitos, o
Brasil está se propondo a uma política de segregação infanto-juvenil.
Não necessitamos de propostas
simplistas, imediatistas e reducionistas de direitos. O Estado precisa
favorecer a institucionalização do Sistema de Garantia de Direito, fundamentado
no Art. 86 do ECA, fornecendo condições para que os órgãos públicos integrantes
dele, implementem as políticas públicas e, atuando articuladamente com a
sociedade civil, previnam violações e defendam direitos de crianças e
adolescentes.
Então, com este sentimento, convocamos
a todos e todas a serem proativos, a pesquisarem, a conhecer o tema, e com base
em dados e pesquisas que revelam a verdade, não se iludirem com “argumentações”
carregadas de senso comum, sem aprofundamento e comprovação, evitando dessa
forma o risco de ser massa de manobra, daqueles e daquelas que fazem uso fácil e
manipulado da opinião pública, não assumindo suas verdadeiras responsabilidades
com as questão sociais no Brasil. E nesse aspecto, o Nelson Rodrigues nos faz
pensar!
“É
fácil livrar-se das responsabilidades.
Difícil é escapar das conseqüências
por se ter livrado delas”
(Nelson Rodrigues)
O momento é de nos unirmos e juntos
fazer valer os Direitos das Crianças e Adolescentes nesse País, em todos os
aspectos, direcionando nossas forças e energia para o cumprimento do que rege a
Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente e o SINASE.