quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Nota Técnica do CEDCA/PE

Segue abaixo a Nota Técnica aprovada pelo Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Pernambuco (CEDCA/PE), em relação ao descumprimento dos parâmetros do SINASE, em relação ao Meio Fechado, no Estado de Pernambuco, a qual solicita providências das autoridades competentes.

NOTA TÉCNICA

Assunto: Em Defesa da Democracia, das Normativas Internacionais,Nacionais e Estaduais e dos Compromissos Firmados em Prol do Sistema de Atendimento Socioeducativo em Pernambuco. 

I – Em Defesa da Democracia

A Década de 1980 foi marcada por efervescências políticas democratizantes, sendo a Campanha das Diretas (1984), a nova Constituição Brasileira (1988) e as eleições presidenciais (1989) parte de um longo, difícil e rico processo que culminou com o fim do período de Ditadura Militar e Civil (1964-1985). As três datas simbolizam emblematicamente a recente História da República, e tem na Constituição Federal, uma evidente opção por um modelo de Sociedade e de Estado onde o respeito às instituições democráticas precisam de afirmação cotidiana e as conquistas ampliadas permanentemente dentro das regras e do processo democrático.

Nesta perspectiva o Art. 1º da Constituição Federal afirma que a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal e constitui-se em Estado Democrático de Direito, fundamentada, entre outros valores, na cidadania e na dignidade da pessoa humana; e que “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes   eleitos   ou diretamente nos termos desta Constituição”.  A leitura articulada e combinada  dos artigos 227 e 204 da Constituição Federal são balizadoras da institucionalização da descentralização das decisões políticas e da participação como forma de exprimi-la. Neste cenário, o Sistema de Conselhos,  que na área específica da criança e do adolescente, acrescentou a esfera pública os Conselhos Tutelares – existentes na esfera municipal – e os Conselhos dos Direitos – nacional, estaduais, Distrital. Ambos os conselhos, depois de criados não poderão ser extintos por atos dos poderes instituídos.

É através dos Conselhos de Direitos, órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, composto por representantes do Poder Executivo e de organizações representativas da sociedade civil (Art.88, II do Estatuto da Criança e do Adolescente), que o Art. 1º da Constituição Federal ganha vida política.   Em outras palavras: foi uma das maneiras que a Constituição Federal encontrou para que o poder do povo seja exercido   conforme   as   determinações   constitucionais, recepcionadas na regulamentação do mencionado Estatuto.

Frente a tal compreensão é que o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (CEDCA/PE), órgão composto por sete (07) secretarias do Governo do Estado e igual número de organizações da sociedade civil (vide anexo 01) apresenta a Nota Técnica em Defesa da Democracia, das Normativas Internacionais, Nacionais e Estaduais e dos Compromissos  Firmados  em  Prol  do Sistema Socioeducativo em Pernambuco.  

II – Em  Defesa do Estatuto da Criança e do Adolescente, da Resolução N,º 119/2006 e da Lei Federal N.º 12.594/2012 que instituem o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo e da Resolução N.º 31 que aprova o Plano de Reordenamento do Sistema Socioeducativo do Estado de Pernambuco (2010-2015)

O Estatuto da Criança e do Adolescente em sintonia com a Constituição Federal (Art. 5º, §§ 1º, 2º e 3º * ) e a Convenção Internacional dos Direitos (ONU, 1988), quanto a esta por ser um documento de direito internacional, segundo Flávia Piovisan “Impõe-se ainda ao Estado o dever de harmonizar a sua ordem jurídica interna à luz dos parâmetros mínimos de proteção dos   direitos humanos – parâmetros estes livremente acolhidos pelos Estados”, estabelece um conjunto de seis (06) Medidas Socioeducativas, sendo todas determinadas pelo Poder Judiciário. As duas primeiras (advertência e a obrigação de reparar o dano) são aplicadas diretamente pela Justiça da Infância e Juventude; a prestação der serviço à comunidade e a liberdade assistida são desenvolvidas no âmbito municipal diretamente pelas prefeituras ou organizações da sociedade civil. Ao Governo do Estado cabe a execução da semiliberdade e da internação, sendo que esta deve ser em estabelecimento educacional (Art. 112/VI do 
Estatuto da Criança e do Adolescente). 

* § 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do 
Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Atos aprovados na forma deste parágrafo)

As resoluções de N.º 46/1996 e N.º 119/2006, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, são normativas regulamentadoras da medida de internação. Pela primeira Resolução fica definido que uma unidade de internação não poderá,   isoladamente, ser construída para mais de 40 adolescentes. Já a Resolução de 2006, que fixa como norma nacional os parâmetros   para a institucionalização do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo admite que é possível construir mais de uma unidade num mesmo terreno, desde que o total de adolescentes  não pode ser superior a 90.  Nesta situação, é possível a existência, por exemplo, de três unidades de internação, num mesmo terreno, sendo cada uma para até 30 adolescentes. 

Tanto na unidade para 40 adolescentes quanto no conjunto de unidades (dentro do limite máximo de 90) devem existir espaços residências para até 15 adolescentes, conforme os Parâmetros Arquitetônicos para Unidades de Atendimento Socioeducativo, integrante da Resolução do Sinase. O CEDCA/PE, por sua vez, aprovou por unanimidade a Resolução N.º 31/2010 que institui o Plano de Reordenamento do Sistema Socioeducativo em Pernambuco, com três focos centrais: 

1) Expansão dos Programas em Meio Aberto (prestação de serviço à comunidade e a liberdade assistida) mediante apoio técnico e financeiro do Governo do Estado aos municípios;

2) Concurso Público para Funase e formação continuada dos operadores do Sistema Socioeducativo;

3) E construção de novas Unidades de Atendimento, conforme demanda identificada.

Importante assinalar que o Plano de Reordenamento do Sistema Socioeducativo guarda total consonância com as Resoluções do Conanda e com a Lei Federal N.º12.595, que institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo. Não se deve permitir que não sejam consideradas as decisões do Conselho, posto que suas deliberações se constituem numa decisão de Estado, posto ser o CEDCA/PE integrante da estrutura colegiada desse, nos termos da Constituição Federal (Arts. 227, §7º e 204), com competência deliberativa (Art. 88, II do Estatuto). Por isso vincula a Administração Pública que tem o dever de cumpri-la, nos termos do princípio da  prioridade  absoluta desse segmento da população  (art.4º, par. único, alíneas "b", "c" e "d", da Lei nº 8.069/90). Não estando seu descumprimento adstrito da tutela jurisdicional, quanto a isto já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça:

“ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL AÇÃO CIVIL PÚBLICA 
ATO ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO: NOVA VISÃO. 
1. Na atualidade, o império da lei e o seu controle, a 
cargo do Judiciário, autoriza que se examinem, inclusive, as 
razões de conveniência e oportunidade do administrador. 2. 
Legitimidade do Ministério Público para exigir do Município a 
execução de política específica, a qual se tornou obrigatória 
por meio de resolução do Conselho Municipal dos Direitos da 
Criança e do Adolescente. 3. Tutela específica para que seja 
incluída verba no próximo orçamento,a fim de atender a 
propostas políticas certas e determinadas. 4. Recurso especial 
provido (STJ, RESP 493811, 2ª T., Rel. Min. Eliana Calmon, j. 
11/11/03, DJ 15/03/04).”

Por analogia, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça é aplicável às esferas federal e estaduais e nesta direção o Governo de Pernambuco deve pautar sua atuação em estreito cumprimento das normativas e dos compromissos firmados.  

III – Em Defesa dos Compromissos Firmados 

Frente ao exposto, e tendo presente a deliberação do CEDCA/PE na 305ª Assembleia Ordinária, realizada em 07 de novembro de 2013, vem apresentar aos Operadores do Sistema de Garantia de Direitos, seu posicionamento em Defesa dos compromissos firmados, que estão consubstanciados nas normativas internacionais, nacionais e estaduais. Nesta direção, solicita-se do Governo do Estado de Pernambuco que:

1) Apresente o quadro do Concurso Público realizado para a Fundação de Atendimento Socioeducativo (Assistente Social, Pedagogo e   Psicólogo), informando os quantitativos e a lotação das nomeações por unidade de atendimento, bem como o processo de formação;

2) Quais os móvitos políticos, jurídicos e pedagógicos para a não realização do concurso público para os socioeducadores;

3) Quais  procedimentos já  encaminhados  para  dotar   a  Defensoria  Pública   do Estado de quadro de defensores responsáveis pela defesa técnica-jurídica dos adolescentes e jovens atendidos na Funase;

4) Qual o volume de recursos financeiros que serão repassados do Fundo Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente aos respectivos fundos municipais, tendo presente que o Governador do Estado anunciou, em encontro com os prefeitos no primeiro semestre de 2013, um valor per capta de R$ 300,00 (trezentos reais) para cada adolescente em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto;

5) E finalmente apresente o calendário de construção das unidades de atendimento socioeducativo, conforme Termo de Compromisso (N.º 001/2012) assinado, em 30 de maio de 2012, com o Ministério Público de Pernambuco (anexo), especialmente no tocante: 

a) Ao estagio da construção das quatro (04) unidades de internação provisória: Recife, Paulista, Arcoverde e Garanhuns;
b) As oito (08) unidades de internação: Duas em Recife, Olinda, Paulista, Jaboatão dos Guararapes, Cabo de Santo Agostinho,   Arcoverde e Garanhuns;
c) O funcionamento da Unidade de Vitória de Santo Antão, especificando o público a ser atendido (faixa etária e perfil infracional)  e a proposta pedagógica;
d) E as reais perspectivas de desativação do CENIP – Recife e os Cases de Abreu e Lima e Cabo de Santo Agostinho no prazo fixado no Termo de Compromisso.

Todos os itens acima estão contemplados nas Cláusulas Terceira, Quarta e Quinta do mencionado Termo de Compromisso. 

Ao Ministério Público de Pernambuco solicita-se posicionamento no tocante ao cumprimento do Termo de Compromisso e informações referentes a Cláusula Oitava e um posicionamento formal quanto a decisão (já em andamento) do Governo do Estado em construir um Centro de Internação Provisória para 240 adolescentes, 150 a mais do que as norma nacional, na antiga sede da Funase na Av. Abdias de Carvalho, Recife. 

O embasamento para as solicitações do CEDCA/PE estão ancoradas no poder deliberativo dos Conselhos de Direitos, uma definição Constitucional incorporada no Estatuto da Criança e do Adolescente e referenciada pelo Superior Tribunal de Justiça que reconhecer legitimidade do Ministério Público para exigir que a execução  da política aprovada pelo Conselho de Direito deva ser efetivada.   

Recife, 06 de dezembro de 2013

Nivaldo Pereira da Silva
Presidente do CEDCA/PE

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